29 de janeiro de 2008

Réplica à Leitora

Caríssima Leitora, evidente que uma boa infra-estrutura material e também logística pode sim proporcionar um maior conforto aos turistas no que concerne às belezas naturais do Brasil. Para citar um exemplo, os bondinhos do Rio de Janeiro. Porém, insisto que a pura beleza em si é o maior sustentáculo desse tipo de turismo. Hotéis, transportes e segurança (embora esses últimos dois fatores míngüem) contribuem sim, mas o cerne do meu argumento ainda é válido.
Ora, compreensivelmente as autoridades não vão permitir que as favelas desçam e se instalem nos pontos turísticos mais relevantes das cidades. Isso não é só no Rio de Janeiro. Não consigo imaginar a prefeitura de Nova York permitindo que os habitantes do Harlem se instalem na Times Square. Esse tipo de ação é comum em qualquer lugar do mundo. Enfim, o que o Brasil faz é ceder um mínimo de estrutura aos turistas. As praias, o corcovado, o sol e as orlas cuidam do resto. Temos sorte de nosso país possuir tantas belezas naturais. Não fosse isso, o turismo aqui não vingaria.
Quanto ao ciclo apresentado por você, nada a acrescentar. O estado brasileiro nunca combateu de forma eficiente as raízes da criminalidade. Sempre tentamos remediar, e nunca prevenir. Como não tivemos um histórico de inclusão, educação e distribuição mais justa de renda, só nos resta punir. E eu não penso que isso seja a alternativa mais justa, mas é, infelizmente, o que deve ser feito de imediato para que não se perca o controle.
Caríssima, infelizmente temos de abraçar a realidade, por mais que ela seja injusta. Precisamos sim de policiamento e mecanismos de punição aos criminosos. E esse policiamento, que fique claro, não só de forma restrita aos habitantes das classes mais abastadas, mas também aos próprios moradores de bem das favelas. Infelizmente tenho de advertir que citar a Constituição Federal é cair no mar da utopia. Se enumerarmos cada item que o próprio estado fere, ficaríamos a conversar por boas horas.
O engajamento social ajuda, mas não é tudo. E não adianta colocar a culpa toda nos políticos, pois eles são uma extensão de nossa sociedade. Não devemos nem podemos tratar o povo brasileiro como pobres coitados. Nosso povo é de uma ignorância e de um conformismo ímpares. Como você já deve ter reparado, a nação só se une em época de Copa do Mundo ou quando é para escolher uma estátua como uma maravilha do mundo.
Leitora, reproduzo aqui um trecho de seu texto: “Além de ser muito mais eficaz e cômodo para nós construirmos enclaves fortificados em nossas casas e prédios com circuito interno de tv, segurança particular e portaria 24 horas do que nos engajarmos e investirmos em um projeto sério de transformação social.”.
Não dá para criticar o ato de muitas pessoas construírem verdadeiras fortalezas em suas casas. Penso que se eles possuem condições para isso, tudo bem. E, dados os índices de criminalidade no país, é também útil. Não poucos casos eu vi de pessoas que tiveram suas vidas salvas por um carro blindado ou coisa parecida. A transformação social que você levantou só será possível se acontecer uma mudança política radical nesse país. Oxalá isso ocorresse, mas dado o histórico da nossa nação, sempre é mais seguro esperar pelo pior. Além da reforma política, é preciso também uma mudança na mentalidade das pessoas, incluindo as pessoas pobres e necessitadas que muitas vezes contentam-se com algumas esmolas governamentais. Países como Alemanha e Japão já conseguiram se reerguer de situações terríveis, ao passo que o Brasil é um elefante estagnado. Nota-se, com isso, a diferença cultural.
Quanto ao dado que te apresentei de turismo de favela, é realmente assustador, mas é algo que curiosamente existe. E, embora não seja um ramo majoritário, compõe o que o Brasil Ganha em turismo.

Kaká

Leitora, o jogador Kaká tem sim o direito de doar a porcentagem de dinheiro que ele quiser a quem ele bem entender. Isso jamais foi negado e é um direito que todo cidadão tem. O seu argumento cultural é totalmente válido. Minha cara, o Kaká não está sendo acusado de nada. Será apenas interrogado por manter uma relação próxima com duas pessoas acusadas de diversos crimes. As perguntas, de acordo com reportagem da Carta Capital, seriam as seguintes: “Qual é seu grau de amizade e que relação tem com as pessoas acusadas? Os acusados costumam freqüentar a sua casa na Itália ou no Brasil? O senhor freqüenta a casa deles no Brasil ou nos Estados Unidos? Você sabe o destino que foi e que é dado ao dinheiro das suas colaborações?”.
Reproduzo abaixo as acusações contra o casal Hernandes:
Segundo a Folha de São Paulo, o Ministério Público apresentou denúncia na Justiça contra os bispos devido à criação de uma “igreja laranja” para desviar os processos destinados à Renascer em Cristo, franquia de templos propriedade dos Hernandes. O Ministério levantou que as empresas ligadas à igreja respondem por mais de 100 processos. Ainda são acusados por crimes de estelionato, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro. Nem o montante arrecadado nos dízimos se salva. O órgão afirma que o valor seria usado para pagar funcionários das empresas controladas pelos Hernandes. Diante de tantas irregularidades, a Justiça, enfim, determinou o bloqueio de bens e contas bancárias dos donos e das companhias ligadas aos religiosos.
Ora, tenho certeza que se eu tivesse algum nível de proximidade com pessoas desse calibre, também seria interrogado. Repito, o Kaká não está sendo acusado de nada. E se ele realmente não tiver nada a esconder, certamente irá contribuir com o trabalho da polícia.

Um comentário:

Anônimo disse...

Achei excelente que mais pessoas como a "observadora do passado" também estejam comentando seus textos. Deve ser interessante saber que às vezes há pessoas que você nem imagina que lêem seu blog e precisam só de um incentivo para comentarem. E se a "observadora" se encarojou com o nosso debate tanto melhor. Além disso, quero comentar que se ela tem os motivos dela para usar um pseudônimo, já os meus são muito simples. Em primeiro lugar, como não faço parte do seu círculo de convivências não faria diferença para você saber se meu nome é x ou y. Já do meu lado, como não busco outra coisa aqui a não ser um debate limpo e aberto sobre assuntos de meu interesse, achei que o pseudônimo seria mais apropriado para esses fins. Prefiro manter minha humilde função de como "leitora", ler criticamente seus textos e colocar minhas críticas para sua apreciação. Você que merece assinar seus artigos e não eu com minha meia dúzia de críticas, pois quem está se expondo mais com suas idéias é você e não eu que me fico na cômoda função de apenas criticá-las... E faço isso pois já andei por inúmeros blogs, mas logo que, por acaso, visitei o seu me identifiquei com os assuntos que variam desde religião à política. Além do mais, como já disse você possui um estilo provocante e confesso que o primeiro impulso que temos é logo refutá-lo. E exatamente é essa a razão que me gera reflexão já que eu sempre procuro analisar todos os lados de uma questão. Esclarecidos esses pontos vamos ao que interessa...
Concordo que a beleza é sim fundamental, mas em uma escala de importância os investimentos feitos para que essa beleza reluza esta em uma patamar acima dela mesma. É justamente por isso que deveria haver maiores invstimentos para fomentar o ecoturismo no nosso país e aproveitar melhor as belezas naturais do Brasil. Além de ser uma alternativa de desenvolvimento sustentável para regiões de pequena participação econômica no PIB nacional e que muitos pensam apenas no negócio de exploração de nossa tão bela natureza!
E eu preciso continuar acreditando que a nossa Constituição não é apenas um conjunto de recomendações, mas de normas de caráter imperativo e ue devem ser observadas de acordo com o seu tipo. Mas concordo com você, muitas vezes o meu maior pecado em minhas argumentações é não "abraçar a realidade" como você disse. Joguei realmente displicentemente o "engajamento social" não observando como essa expressão é vaga. Além disso, percebi com sua réplica que foi uma crítica completamente hipócrita a que eu fiz as classes mais abastadas quando se preocupam com seus enclaves fortificados, uma vez que não vejo como acontecer uma transformação social que eu mesma citei. Mas fiquei curiosa quanto a sua idéia de transformação política. De que tipo ela seria?!
Você ainda diz que é necessária uma mudança na mentalidade das pessoas. Concordo com você, mas me encontro sempre em um dilema sem resposta. Seria a consciência social capaz de desenvolver as áreas carentes de nossa sociedade, ou o desenvolvimento das condições materiais da vida social que alteraria o pensamento dos brasileiros, como diria Marx em seu materialismo? Porque como pensar em mudança de mentalidade sem o desenvolvimento das condições de vida da população? Mas também como pensar em mudanças se as pessoas não mudarem a mentalidade? O que você pensa a respeito?
E realmente não sabia desse turismo de favela. Como disse sociologicamente, e pelo visto até economicamente com as taxas de crescimento citadas, chega a ser um dado muito importante.

Já em relação ao Kaká, comprendi o que você quis dizer em seu texto. Na verdade já estava com uma idéia preconcebida do assunto devido a alguma reportagem sensacionalista que colocava o jogador quase como um acusado de algum crime. Mas se realmente o promotor está em sua investigação intimou pessoas próxima ao casal de "pastores" para prestar depoimento não há nada de anormal no trabalho do Ministério Público. Concordo com você que ele irá contribuir com seu trabalho já que é muito provável que não tenha nada a esconder.
Quanto a "quadrilha da Renascer", expressão usada por você, composta por seus líderes acusados de tantos crimes gravíssimos, só resta o meu nojo e a repugnância, como já disse, por corromperem a fé de muitos naquilo que amam, uma vez que qualquer igreja, principalmente uma com tantos fiés na maioria sinceros, possui uma relevância sociocultural inegável, sem falar na importância individual na vida de cada de seus membros. Só espero que dessa vez a justiça não falhe e principalmente não tarde em punir quem ilude pessoas que procuram as igrejas como refúgio das mazelas do mundo e acabam se deparando com outras maiores nesse lugar...